por Tiago Miranda - Agência Câmara
Publicada em 25/04/2014 11:21:42
A campanha das Diretas Já uniu pessoas de diferentes tendências políticas e levou milhões para as ruas das cidades brasileiras. Isso indicava que a aprovação da emenda Dante de Oliveira estava garantida, mas não foi o que aconteceu. Em 25 de abril de 1984, faltaram 22 votos na Câmara para o texto seguir para o Senado. Não apareceram na votação 113 deputados – a esmagadora maioria do PDS, partido de apoio do regime militar.
A pressão dos militares pela não aprovação da emenda era grande. O então presidente, João Figueiredo, chegou a apresentar uma emenda na semana anterior à votação propondo eleições diretas para escolher o sucessor de seu sucessor. Como quiseram alterar o texto e garantir eleições diretas para escolher o presidente já depois de Figueiredo, o general retirou o texto.
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O deputado Paulo Maluf (PP-SP) foi um dos parlamentares que faltaram à votação da emenda. Segundo ele, havia uma orientação do partido para que os deputados do PDS, partido de apoio da ditadura, não votassem a favor das Diretas Já.
“É uma ironia do destino, dizem que Deus escreve certo por linhas tortas. Ou, às vezes, Deus escreve errado por linhas certas. O que aconteceu é que o presidente do PDS chamava-se José Sarney. E a Executiva do PDS, partido do Sarney, que era o meu também, fez uma resolução proibindo os seus filiados de votar nas diretas. Tanto é que foi construído, na ocasião, o PFL para sair da sanção”, disse Maluf.
O senador Pedro Simon (PMDB-RS), que foi um dos principais articuladores da campanha das Diretas Já, lembrou que houve muita pressão do governo no dia da votação. “Pressão dos militares e coação de fechar o Congresso de novo e cassação dos parlamentares que tivessem votado”, afirmou.
Como os militares já haviam feito isso anteriormente, de acordo com Simon, muitos deputados ficaram com medo. Ele lembra que, ainda assim, muitos parlamentares do partido governista votaram a favor da emenda.
É o caso do deputado Sarney Filho (PV-MA), que, mesmo sendo do PDS e filho do presidente do partido, votou a favor da volta à eleição direta para presidente da República. Segundo ele, a pressão das ruas e a sua idade (tinha 27 anos na época), foram essenciais para o voto “sim” à emenda.
“Eu era muito jovem, universitário ainda e, portanto, estava muito mais sujeito e exposto à pressão popular e à opinião pública. E, evidentemente, muitas dessas opiniões, dessas pressões tiveram efeito sobre a minha atitude de votar a favor das diretas”, afirmou Sarney Filho.
Para o presidente da Câmara, Henrique Eduardo Alves, que também era deputado em 1984 e votou a favor da emenda, a noite foi frustrante. “Talvez tenha sido a noite mais frustrante de que eu participei no Congresso Nacional. Era como se estivesse caminhando, chegando a um ponto de satisfação, de realização, comunhão com o povo brasileiro e, de repente, se partisse”, disse Alves.
Articulação
O desânimo geral nas universidades, nos ambientes de trabalho e nas conversas de bar após a derrota da proposta contrastava com as negociações de bastidores, que ocorreram antes mesmo da votação da Emenda Dante.
Antes da votação, enquanto o Brasil ainda acreditava que seria possível aprovar as eleições diretas, uma parcela da classe política, mais pragmática, começava a pensar no dia seguinte e em um plano alternativo.
Com a derrota das Diretas Já, políticos da oposição e os que apoiavam o governo militar, mas estavam descontentes com a candidatura oficial do deputado Paulo Maluf ao Colégio Eleitoral, começaram a articular a candidatura de Tancredo Neves para as eleições indiretas.
A ex-deputada Thelma de Oliveira, viúva de Dante, lembra como a escolha de Tancredo conseguiu canalizar a vontade popular. “O movimento poderia ter morrido naquele momento e não morreu. O movimento continuou, amadureceu, entendeu que era importante vir para o Colégio Eleitoral, com um nome que juntasse todas essas pessoas, todo o sentimento do povo brasileiro e com o nome do Tancredo Neves.”
O ex-deputado Domingos Leonelli era um dos escudeiros do PMDB na campanha por eleições diretas. “Na prática, a ditadura caiu com as Diretas Já, tanto é que implodiu o Colégio Eleitoral. Quando o Tancredo Neves se candidatou para o Colégio Eleitoral, aquele Colégio Eleitoral estava praticamente implodido. E ele usou na campanha dele, Tancredo, os símbolos e todo o impulso dado pela campanha das Diretas Já.”
A eleição de Tancredo sobre Maluf, o indicado pelo PDS, encerrou o ciclo militar. Mesmo com sua morte, seu vice, José Sarney, cumpriu a promessa de convocar uma Assembleia Nacional Constituinte.
O jornalista Ricardo Kotscho, ex-secretário de Imprensa do governo Lula, acompanhou pessoalmente os comícios das Diretas Já. Ele lembra que o dia da votação foi marcado por um clima de guerra. Brasília estava sob estado de emergência, com manifestações públicas e aglomerações populares proibidas.
"O comandante militar do Planalto era o general Newton Cruz, que fazia ameaças, que ia pessoalmente para a rua, com o chicotinho dele. O clima era o pior possível. Agora, a grande tristeza mesmo veio dos políticos”, afirmou.
De acordo com Kotscho, deputados do PDS, que pensavam em votar a favor das diretas, receberam telefonemas de Figueiredo com ameaças de um futuro sombrio para o partido. O pesadelo descrito pelo presidente da República seria a eleição de Leonel Brizola, então governador do Rio de Janeiro e uma das principais lideranças do movimento pró-diretas.
O dia 25 de abril de 1984 deveria ser de festa, mas o País foi dormir frustrado e revoltado. Por apenas 22 votos, a emenda não atingiu os 320 votos necessários para que fosse enviada ao Senado. Foram 298 votos a favor, 65 contra e 3 abstenções. Coube ao então presidente do Senado, Moacyr Dalla, anunciar o resultado, em meio a vaias do público que estava nas galerias.
"Foi uma tristeza enorme, nós fomos para a sucursal da Folha escrever, e a gente se encontrou nos bares, muita gente estava chorando, os artistas que participaram de toda a campanha. Foi uma tristeza geral", disse Kotscho.
Fonte: Tribuna da Bahia.
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