quarta-feira, 2 de novembro de 2016

EPS do PT: PONTOS PARA A UNIDADE SUBSTANTIVA DO PARTIDO DOS TRABALHADORES.





"Eu sou o espírito que tudo nega!

E assim é, pois tudo o que existe merece perecer miseravelmente." (Mefisto, in Fausto, de Goethe)

A unidade burocrática do PT está em xeque. E isso não se deve às derrotas eleitorais recentes. Mas, ao esgotamento de um ciclo partidário. Um ciclo histórico e ideológico. Ou bem fazemos esse profundo processo autocrítico, ou bem mereceremos perecer miseravelmente!

A dialética de nossa crise partidária é o resultado de uma síntese de determinações diversas:

a) O cerco que sofremos da burguesia, de seus setores oligopolistas (e com alguns dos quais nos aliamos “ingenuamente”), se deve, principalmente, aos nossos méritos: sinalizar que a democracia substantiva pressupõe ampliar o acesso a bens e direitos às amplas massas;

b) Porém, esse cerco só teve êxito em face de erros internos nossos: sobretudo às crenças ideológicas em quimeras tais como “democracia como valor universal”, “Estado democrático de direito”, no “republicanismo” sem caráter de classe. Expressões polissêmicas, interpretadas ao gosto do pronunciante de ocasião. Expressões desorientadoras que, sob o encanto das benesses do poder, podem ter levado alguns e algumas ao deleite de prerrogativas moralmente condenáveis.

c) Hoje, o conjunto do partido sofre por erros que não foram da totalidade do coletivo. Por que não refutamos, publicamente (como partido), a arenga do “déficit da previdência”? Por que o Partido se recusou a defender a “auditoria cidadã da dívida pública”? Por que não criticamos a paralisia da reforma agrária? Por que não demarcamos com o desmonte da reforma urbana, a partir do esvaziamento do Ministério das Cidades, que foi destinado a ser mero objeto de troca com a base aliada? Por que não levamos a fundo a CPI do Banestado (uma genuína obra tucana; o maior escândalo, de fato, da política brasileira)? Por que não democratizamos as telecomunicações?

d) E é preciso ficar claro: várias dessas imprecisões conceituais e recuos políticos são também de responsabilidade de vários campos, para além do “majoritário”. Ainda que este tenha que reconhecer que os ônus principais são seus e têm que ser assumidos sem tergiversações. Também não contribui para o esforço de construção da unidade - no debate e na autocrítica - manifestações que sugerem possíveis desligamentos de quadros do PT. Essa é uma ameaça real, mas não deve ser usada como “argumento”. Isso sectariza e fornece insumo aos nossos inimigos.

e) Avançando na reflexão autocrítica, reconhecemos que uma coisa é ser base de nossos governos e agir com lealdade política. Mas, não a lealdade canina, que – ao final - praticamos. Um governo de coalizão nos daria relativa autonomia, seja de bancada, seja das frentes de massa do partido. Não soubemos conduzir isso. O sentido de “governabilidade” fez o partido baixar a guarda ideológica sobre princípios elementares à esquerda e que, além de deixar o partido sem referências na nossa base social, desenvolveu um pragmatismo negocial que o levou para a vala comum da política. A política do vale tudo. De tal forma que o abominável cinismo do “baixo clero” (do Congresso) entrou no cotidiano da vida partidária, seja nas relações internas, seja com os aliados.

f) A unidade partidária, antes de ser um pacto de silêncio e arreglos internos, deve se constituir à base do franco debate de ideias. O reencontro do partido com as ruas precisa trazer as ruas para dentro do Partido. Fazer o PT se reencontrar com a base social de esquerda no país. Retomar o caráter classista de organização partidária, com disposição e disponibilidade para se unir aos diversos segmentos da esquerda contemporânea, sem diminuir as dimensões de gênero, raça e da disputa cultural no centro da sua estratégia. Nossa autocrítica não deve ser dirigida à Globo, à FSP, ou à Fiesp, ou à Febraban, mas à base social que queremos representar. Nossos pontos de partida são os seguintes:

i) resgatar a centralidade ontológica do trabalho na sociabilidade humana (ou seja, não há conciliação possível, o tal jogo ganha-ganha, entre capital e trabalho);

ii) Fazer a crítica da democracia burguesa (como um valor universal), ao dito Estado democrático de direito e ao republicanismo carente de substantivação, que são papéis que foram rasgados pela própria burguesia e não caberia à esquerda tentar colá-los;

iii) lutaremos pela auditoria da dívida pública, pela retomada da CPI do Banestado, e pela democratização das comunicações (reconhecendo publicamente nossos déficits nessas frentes);

iv) a reforma política e eleitoral, que não peitamos, deve ser feita, com a indicação de seu caráter urgente: o sistema atual é corruptor e desalojar um partido do poder nada representará no combate à corrupção, se a atual estrutura for mantida.

g) O PT deve ter a ousadia de reconhecer que esse sistema corruptor contaminou até mesmo práticas internas do partido, no que diz respeito ao financiamento partidário e eleitoral. E que maiorias internas foram constituídas à base desses recursos. Ainda que o PT seja um sócio menor de todo esse processo, e que o PMDB, o PSDB, o DEM e o PP sejam seus sócios maiores, foi um erro ter conciliado com essas posturas. E quem tinha controle sobre isso deve reconhecer sua responsabilidade nisso tudo.

h) Uma autocrítica dessa magnitude pode resgatar a condição de pólo aglutinador da esquerda, no país, que o PT já teve. A composição das direções deve corresponder às demandas do novo tempo e da cobrança de nossa base social. A despeito do justo reconhecimento do trabalho de quadros internos dedicados ao trabalho organizativo, é preciso que uma nova direção reflita a necessidade de nos expormos às forças vivas da sociedade. Dirigentes especialistas em técnicas de PED, em “contar garrafinhas”, em operações burocráticas de manutenção de seu status quo, só agravam a situação do PT. E que as questões de gênero, raça e juventude adquiram a importância devida, para além do tratamento formal e burocrático que têm recebido.

*Sobre o PED*

Assim, é preciso ficar claro: o processo de eleições diretas das direções (PED) gerou uma grande expectativa de oxigenação do Partido. Porém, no quadro atual chega a ser pior do que o processo eleitoral burguês tradicional. O PT não sobreviverá aos vexames que decorrem do mesmo: ocorrências policiais, fraudes, agressões físicas e até compra de votos.

*Sobre a oposição ao governo golpista*

A oposição ao governo golpista, além dos traços acima delineados, tem que reforçar avanços que tivemos e que estão sendo desmontados e ameaçados por Temer e seus asseclas. A intolerância religiosa, a violência contra as mulheres, o preconceito contra a população LGBT, o morticínio da juventude negra, tudo isso tende a recrudescer nesse ambiente de regressividade cultural e social que embasou o golpe contra a presidenta Dilma.

A cruenta perseguição a Lula é parte integrante desse cenário. O golpe mostra sua fraqueza aí. Para se legitimar, precisa prender Lula, cassar o registro do PT, prender Dilma Rousseff e, se mesmo assim continuarmos a militar, tentarão tirar de circulação centenas de quadros, perseguir outros, desempregá-los e, em certos casos, até mesmo partir para a eliminação física.

Contra tudo isso devemos avançar na reconstrução do Partido. Não é apenas pelo PT e pelos petistas. Não é apenas por nosso legado. Mas, pelo Brasil, pela América Latina, pela África e pelos povos que vivem as ameaças do imperialismo.

Que o Congresso seja o espaço dessa reconstrução do Partido. Que o legado positivo do Partido não seja mero pretexto para a manutenção de hegemonias historicamente superadas.

A COMISSÃO EXECUTIVA DA COORDENAÇÃO NACIONAL DA *EPS do PT*
*Esquerda Popular Socialista do Partido dos Trabalhadores*
Outubro de 2016

Nenhum comentário:

Postar um comentário